Após a apresentação do relatório, da manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR) e das sustentações orais das defesas dos oito réus apontados como integrantes do “núcleo central” da suposta tentativa de golpe de Estado, o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados entra em uma fase decisiva no Supremo Tribunal Federal (STF). Com isso, os ministros da Primeira Turma iniciam a fase de votação para definir se os acusados serão condenados ou absolvidos.
O primeiro a se manifestar será o relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, responsável pela Ação Penal nº 2.668. Seu voto está previsto para começar às 9h desta terça-feira (9) e deve durar cerca de quatro horas. Moraes apresentará os fatos, analisará os pedidos das defesas, avaliará as chamadas preliminares — questões processuais — e, por fim, indicará se os réus devem ser condenados ou absolvidos, além de sugerir penas para cada caso.
A avaliação será feita individualmente, destacando o papel de cada acusado na suposta trama golpista, conforme apontado pela PGR. Moraes também decidirá se há provas suficientes para condenações e se cabem agravantes que aumentariam as penas. No caso de Bolsonaro, por exemplo, o ex-presidente é acusado de liderar uma organização criminosa, o que pode agravar sua eventual punição.
Acusações
Os oito acusados respondem por envolvimento em ações contra o Estado Democrático de Direito. Sete deles enfrentam cinco crimes; o deputado federal Alexandre Ramagem (PL) responde a três. Os crimes analisados incluem:
- Formação de organização criminosa armada;
- Tentativa de abolir violentamente o Estado Democrático de Direito;
- Golpe de Estado;
- Dano qualificado ao patrimônio da União (exceto Ramagem);
- Deterioração de patrimônio tombado (também excluído no caso de Ramagem).
As acusações relacionadas a danos ao patrimônio histórico e tombado contra Ramagem foram suspensas, por terem ocorrido após sua diplomação como parlamentar, atendendo parcialmente a um pedido da Câmara dos Deputados.
Votação
Após Moraes, o próximo a votar será o ministro Flávio Dino, que deve levar cerca de duas horas para tratar tanto do mérito quanto das preliminares. A expectativa é que o dia termine com os dois votos. Na quarta-feira (10), o ministro Luiz Fux dará seu voto — esperado para ser mais longo e, possivelmente, divergente do relator, principalmente quanto às penas propostas. Fux já se manifestou de forma crítica em outras ocasiões, especialmente sobre as delações de Mauro Cid e a competência da Turma para julgar o caso.
Na sequência, os votos de Cármen Lúcia e Cristiano Zanin estão previstos para quinta-feira (11/9), com a conclusão do julgamento marcada para sexta-feira (12/9), salvo se os trabalhos terminarem antes. Ao fim, será feita a dosimetria das penas — o ajuste entre os votos dos ministros para definir as sentenças finais de cada réu.
Quem são os réus do núcleo central
- Alexandre Ramagem: ex-diretor da Abin, acusado de ajudar a divulgar fake news sobre o sistema eleitoral.
- Almir Garnier Santos: ex-comandante da Marinha, teria colocado tropas à disposição para apoiar o golpe, segundo a PGR.
- Anderson Torres: ex-ministro da Justiça, acusado de dar suporte jurídico ao plano golpista. Uma minuta do golpe foi encontrada em sua casa.
- Augusto Heleno: ex-ministro do GSI, participou de lives com ataques ao sistema eleitoral. A PF encontrou anotações que sugerem envolvimento na tentativa de desacreditar as urnas.
- Jair Bolsonaro: apontado como líder da trama golpista. Teria articulado o plano para se manter no poder após a derrota nas eleições.
- Mauro Cid: ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator. Teria participado de reuniões sobre o golpe e trocado mensagens sobre o tema.
- Paulo Sérgio Nogueira: ex-ministro da Defesa, teria apresentado minuta de decreto que tentava anular as eleições e instituir estado de defesa.
- Walter Braga Netto: ex-ministro e general da reserva, único réu preso até o momento. É acusado de financiar ações golpistas e de ter participado de plano para assassinar o ministro Alexandre de Moraes, segundo delação de Cid.
Início do julgamento
Nos dias 2 e 3 de setembro, os ministros ouviram os argumentos das defesas, que pediram absolvição e criticaram as provas reunidas pela Polícia Federal, além da atuação de Moraes no processo. A PGR, por sua vez, reiterou a defesa da condenação de todos os réus, conforme suas alegações finais.
A defesa de Braga Netto foi uma das mais contundentes contra a delação de Mauro Cid, alegando que as versões do ex-ajudante são contraditórias e pouco confiáveis. Os advogados afirmaram que a prisão do general se baseia em uma delação cheia de omissões e incoerências.
A defesa de Bolsonaro também atacou a credibilidade do delator, negando qualquer envolvimento do ex-presidente com os atos do 8 de janeiro ou com as operações “Punhal Verde e Amarelo” e “Luneta”. Segundo seus advogados, não há nenhuma prova concreta contra ele, nem mesmo nas declarações de Cid.
Críticas ao relator
Várias defesas questionaram a conduta de Alexandre de Moraes. A defesa de Augusto Heleno alegou falta de imparcialidade, acusando Moraes de exercer, ao mesmo tempo, os papéis de juiz e acusador. A defesa de Mauro Cid, por sua vez, pediu a manutenção dos benefícios da delação, alegando que contradições decorrem de estresse e não de má-fé.
Em relação a Alexandre Ramagem, sua defesa afirmou que ele apenas reuniu declarações públicas de Bolsonaro e que não teve participação ativa em qualquer plano golpista. Já a defesa de Anderson Torres negou que sua viagem aos EUA em janeiro tenha sido tentativa de fuga, dizendo que ela foi planejada com antecedência para passar férias com a família.
Acusação da PGR
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, reiterou que a reunião entre Bolsonaro, o então ministro da Defesa e os comandantes das Forças Armadas não foi uma consulta institucional, mas parte da execução do golpe. Para ele, o golpe já estava em andamento naquele momento.
Gonet sustentou que houve uma tentativa real de ruptura democrática, com ataques públicos ao sistema eleitoral e esforços para deslegitimar os resultados das eleições. Ele afirmou ainda que Bolsonaro e seus aliados não aceitaram a derrota e buscaram se manter no poder por meios ilegais.
**Com informações do Metrópoles.